terça-feira, 15 de junho de 2010

AM 24.05.2010 - "Porto Solidário" - Que Papel para as Juntas de Freguesia como parte da solução?

"Boa Noite a todos.
Na anterior Assembleia pude aqui manifestar a preocupação profunda do Grupo do Partido Socialista com os efeitos directos na degradação orçamental da Cidade e da sua capacidade de investimento e auto-superação - características que penso, nenhum de nós está disposto a abdicar - provocada pela falta de competitividade como “escolha para viver” no âmbito da Área Metropolitana, região e país onde se insere. Hoje, que nos debruçamos políticamente sobre um relatório que é técnico, regressamos a esta temática, não sem antes deixar aqui uma nota de assumpção da inexpugnável responsabilidade colectiva que as conclusões do mesmo revelam.
No final dessa minha intervenção pediu-me o Sr. Presidente que cito, “olhasse para Lisboa”. Começaria por lhe responder, estivesse ele presente (estou convencido que o Sr. Vice-Presidente não deixará de lhe transmitir as minhas considerações): não, não olho. E não olho porque não é por lá que passa o Futuro, ou pelo menos o meu. Isto, se não me vir entretanto obrigado a “pendular” de Alfa para Sul ao Domingo e para Norte à sexta, para integrar os largos milhares de jovens (alguns deles altamente qualificados) da minha geração, que aqui nasceram e estudaram mas que engrossam as fileiras da dita Capital; não, Sr. Presidente, Lisboa não é exemplo, a não ser, se calhar, no optimismo com que as suas gentes ainda vão encarando ingerência atrás de ingerência. Como também não é exemplo o Rio De Janeiro, que, sendo uma das mais animadas cidades do mundo Ocidental, não consta que seja uma boa opção para habitar. Ou seja, “multidão na rua”, como este relatório friamente nos lembra, não quer dizer prosperidade.
Se temos de encontrar exemplos, posso olhar para Viseu, Capital da Beira Alta. Foi lá que, antes de escolher viver no Porto, passei boa parte da infância e adolescência e descobri a verdade do que na altura afirmava o Dr. Pedro Santana Lopes - que as assimetrias em Portugal são maiores entre Litoral e Interior do que entre Norte e Sul, um problema herdado do obscurantismo do Estado Novo, que ocultava com o glamour autoritário da propaganda a Fome, a Miséria, a Exclusão e a Emigração que assolavam o país, sobretudo o país rural. Na época em que nasceu a minha mãe, por ex. - década de 40 do século passado - morriam quase 3 em cada 10 bebés que, por azar, não eram de Lisboa mas, digamos, de Bragança ou Viseu. Trinta e seis anos depois, Portugal é líder europeu nos cuidados públicos pré e neo-natal, estando nos relatórios da OCDE colocado à frente da Alemanha, por exemplo, possuindo uma das mais baixas taxas de mortalidade infantil do mundo.
Pasme-se: sem TGV, aliás, sem comboio algum, e apesar do erro estratégico que os tecnocratas que se julgam detentores da “marca capital” incutiram sobre Viseu ao lhe retirarem a estação de comboios no início dos anos 90, este concelho alcançou recentemente os 100.000 habitantes. Ultrapassou dificuldades internas e externas.
E é precisamente aqui - no capítulo da gestão da escassez de recursos e a sua equitativa distribuição, da criação imperiosa de estratégias políticas ao nível territorial que nos poupem mais despesa adiante, mediante a evidente escassez de recursos, no entendimento óbvio da Economia como ciêcia social, que este relatório quase nos grita aos ouvidos; porque os subsídios não são uma invenção de outras classes - artísticas, rurais, desfavorecidas, desempregadas, idosas,  etc... - que não da classe política; os subsídios são a classe política a reconhecer o seu fracasso político, não a sociedade civil a “comer mais do que merece”. Se existe a necessidade de financiar a subsistência em números como este relatório prova cabalmente, essa é uma tragédia cívica, sim,  mas, sobretudo, um problema político. 
Estão os factos sobre a mesa; a equação é complexa e trabalhosa, mas tem apenas uma incógnitra, apenas um “X”. “X” é “a política”, a mediação dos interesses num delicado momento em que um sistema quer acudir à sua própria escassez, mas não consegue mais do que gerar mais da mesma escassez ao fazê-lo, perigando assim a sua Fundação, a sua Idoneidade e Autodeterminação, à medida que, por falta de criatividade e engenho no desempenho público, a insegurança cresce, alimentando a deriva autoritária, eclipsando a participação civil como a destas dezenas de cidadãos que hoje aqui se encontram, privando as suas famílias da sua presença em nome da sua Cidade. Estes são dias em que, por vezes, mais parece que a classe política atrapalha, e que são as dinâmicas sociodemográficas e socioeconómicas que lhe têem de sobreviver e perseverar, ao invés de por elas serem fomentadas e consagradas como “bandeira maior” da nossa prosperidade social.
Citando o malogrado Francisco Sá-Carneiro:

“Cabe-nos cada vez mais dinamizar as pessoas para viverem a sua liberdade própria, para executarem o seu trabalho pessoal, para agirem concretamente na abolição das desigualdades. Para isso mais importante que a doutrinação, é levar as pessoas a pensarem, a criticarem, a discernirem"

Assim, sabendo que a simplicidade e a proximidade têem de ser o mote para um diagnóstico assertivo do qual nasçam soluções políticas criativas e de boa gestão, perguntamos, como ponto de partida para esta noite:
-Tenciona o Executivo repensar o papel essencial das Juntas de Freguesia no que toca ao conhecimento único e relação de proximidade com as populações? E se sim, como pensamos que será o caso, estará o Executivo disposto a considerar o reordenamento político e estratégico do território do Concelho a partir das mesmas? Estará o Executivo disposto a inovar e, ao invés de as tornar em estruturas gradualmente redundantes, permitir-lhes que estejam à altura do seu papel, e terminar com o sufoco que a miserável transferência de 3,3 Milhões de Euros/Ano representa? Este valor não está longe, para um ano da totalidade do território da Cidade, daquele que o Executivo dispende em 4 dias de Grande Prémio, isto para pormos as coisas em perspectiva.
Extrapolando, estará disponível o Executivo para a reavaliação urgente da sua relação com as forças vivas da Cidade?
É que não vejo outra forma, perante a já mencionada escassez de recursos, de nos reencontrarmos. Esta crise que este relatório brutalmente expõe é também ela, política; e por isso termino louvando estes Deputados Municipais que, da Esquerda à Direita, aqui estão sempre com o Porto como “pano de fundo”, e insisto, perante a gravidade dos problemas e a urgência das soluções, reapelando à urgente melhoria das condições de trabalho - físicas, mas não só - desta Assembleia e da importância que política que ela merece.

Muito Obrigado.
Nicolau Do Vale Pais, Independente
Agrupamento do Partido Socialista"